Nacionalismo sazonal

quinta-feira, 12 de junho de 2014
Olá caros leitores,
Todas as coisas tem um começo. A Copa teve o seu hoje. Uma abertura colorida, inspirada e bonita, umas pessoas dançando no meio de um tapete sobre o gramado e uma bola gigante cheia de luzes de LED, que mais tarde revelaria Pit Bull, Cláudia Leite e Jennifer Lopez. Vamos lá, eu esperava um pouco mais de show carnavalesco, porque, convenhamos, você mora num país que tem toda aquela coisa mágica de Carnaval e todos aqueles carnavalescos genialmente criativos e chama uma estrangeira para comandar a abertura da (abre aspas) Copa das Copas.
E teve ainda aquele momento incrível, tocante, emocionante e que ninguém viu, quando um paraplégico chutou uma bola. Eu lembro de quando a televisão só sabia falar disso, que seria a ciência de um brasileiro abrindo a Copa e proporcionando um milagre a um jovem paraplégico, por isso, eu achei que a coisa toda aconteceria no centro do campo, com um "tum-tum" soando de fundo ou algo do gênero, não o pouco brilho que foi.
Houve também comentários sobre as manifestações anti-Copa, ou melhor dizendo, houve uma quase expressa manifestação jornalística anti-os-anti-Copa, só que isso é assunto para um post que ainda está no forno (muahaha).
Porque agora vamos ao momento que todos estavam esperando: o Brasil entrou em campo em trenzinho, demonstrando a "união do time" (aspas aqui colocadas não por ironia, devo dizer, mas porque as palavras são de algum comentarista que não lembro). Os sei lá quantos jogadores de cada país se posicionaram, estufaram o peito e fizeram caras de sério. A torcida brasileira emocionou os jogadores ao cantar o hino nacional mesmo após a melodia ter acabado. Bonito e arrepiante, sim, digam o que quiser, foi um momento tocante.
Mas foi aí que aconteceu: a bola rolou antes que as palavras de Galvão Bueno terminassem de revelar as vaias à presidente.
O choque.
Aquele instante que os microfones não captaram - pelo menos não os da minha TV. O contraste entre o nacionalismo e a vergonha que um povo exibe de sua própria governante. E não é a primeira vez que isso acontece. Ano passado, a presidente foi vaiada na Copa das Confederações quando tentou fazer seu discurso. E este é o motivo pelo qual você não ouviu ela abrir a boca no jogo de hoje (leia esse link para mais informações). Segundo a Folha de São Paulo, as vaias se iniciaram na área vip e ocorreram quatro vezes ao todo, antes da partida, após o hino, após o segundo gol e pouco antes do fim.
Quando Marcelo fez o gol contra logo no começo do primeiro tempo eu juro que comecei a rir. Talvez de histeria, talvez de raiva, talvez de ansiedade, eu não sei. Só sei que foi o gol dele que me inspirou a escrever. Eu tinha e ainda tenho muita coisa a dizer sobre a Copa, mas aquele chute contra a nossa rede, foi a metáfora mais estupidamente conveniente que eu já vi na minha vida.
É loucura, já aviso. Se você gostar de preto no branco ou simplesmente estiver tentando arranjar uma desculpa para fechar a página, o momento de parar de ler é agora.
Pois bem, se você resolveu me dar uma chance, aqui vai minha comparação ruim: na minha visão, nosso país é como aquele gol.
COMO ASSIM?
Dessa forma: as coisas aqui parecem certas até que você realmente olha e estamos indo sempre na direção contrária, orgulhosos por motivos que não são exatamente os melhores.
Veja bem, a miséria diminuiu (essa é a sua primeira visão, é o chute do Marcelo que você achou que impediria o gol croata), mas a educação não está melhor (e isso é quando você realmente olha, quando você vê a bola na rede).
O outro ponto na minha teoria é o seguinte: estamos nacionalistas. Temos cinco títulos, participamos de todos os mundiais, o Neymar está em ótima fase, a Copa está sendo em casa. Quem é que não acha que já levamos mais essa? Rumo ao hexa e tudo mais. Bandeiras por aí, ruas e faces pintadas, hino cantado à capela, camisas amarelas e um bater no peito e uma voz que grita: SOU BRASILEIRO, COM MUITO ORGULHO, COM MUITO AMOR.
E é a isso que eu chamo de nacionalismo sazonal. Porque quando terminar a Copa (ou quando sairmos dela), quem é que vai lembrar do orgulho de ser brasileiro? E quando for outubro e as urnas estiverem nas escolas, quem é que vai vestir uma camisa do Brasil e cantar que é brasileiro com tanto orgulho e amor, que pensou muito bem em quem iria votar?
"E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?" - Trecho do poema "José" de Carlos Drummond de Andrade
 Nós nunca havíamos feito um gol contra na Copa, mas nosso país é um gol contra por si só. É aquela confusão entre o ser e o não ser um bom lugar para se viver. É a terra fértil contra o desmatamento para se plantar soja e criar gado. É a alegria das festas regionais contra a miséria. É o luxo dos estádios contra o sucateamento de hospitais. É a esperança contra a descrença.
Mas que venham os jogos, que venha a alegria, que venha a ansiedade, que se unam todos em frente à TV (isso para aqueles que tiverem energia elétrica em casa), que se vibre e se torça e se grite. Estejamos nacionalistas por um mês. Depois a vida volta ao normal. E daqui quatro anos nos reuniremos novamente para lembrar, nem que somente por um instante, que somos uma nação e que uma nação precisa de seu povo.

*****
Oi gente, ando tão sumida que daqui a pouco é capaz de colocarem uma foto minha como desaparecida (ok, piada ruim).
Enfim, estou tão ocupada que é exaustivo, mas não quero deixar isso aqui às moscas, porque gosto tanto de poder escrever o que penso sem alguém ficar analisando e me dando nota e me dizendo que devo utilizar mais o texto de apoio e evitar marcas de oralidade. Essa coisa toda do blog me dá uma liberdade que eu nem sabia que tinha, por isso, numa tentativa pouco confiável de aliar o que gosto ao que devo, vou postar aqui quando surgir algo que preciso desesperadamente opinar sobre.
Perdoem-me pelo tamanho do texto de hoje e pela pouca quantidade de imagens. Ficou meio cansativo de ler assim, né? Vou tentar me conter na próxima.
Opinem.
E que a força esteja com vocês.


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